quarta-feira, maio 25, 2005

Aviso à Praça

Foi perdida entre a Ipiranga e a São João, ou entre trechos de qualquer urbe, a esperança de que alguma coisa aconteça no coração entre uma ameaça de taquicardia patológica e o seu silêncio mortuário.

Quem souber do paradeiro da referida utopia, é favor elevar a garganta acima dos arranha-céus, dos chafarizes, dos bichos-preguiça nos zoológicos, das antenas que espalham verbos cansados, e dizer em alto e bom som aonde se dirigir cada um com seu desejo de alegria.

sexta-feira, maio 20, 2005

Ação entre amigos

Recebi da Isabel Guimarães esta corrente veiculada na blogosfera. Demorei quase um mês para elaborar minhas respostas de improviso. Mas finalmente, eis o depoimento que vai mudar a história da literatura:

Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?

A Bíblia. Não somente pela vastidão e sabedoria mas também pela poesia e até pelo humor de certas situações, dignas de uma comédia contemporânea. Veja-se, por exemplo, I Samuel 21, do verso 11 ao 15. Há, ainda, o erotismo de Cantares de Salomão e a beleza metafórica dos livros proféticos, de Daniel ao Apocalipse, de Ezequiel a Isaías. E muito mais.

Já alguma vez ficaste apanhadinho(a) por um personagem de ficção?

Certa vez quis estar diante de Pombinha, em pleno ambiente de O Cortiço, mas somente antes de sua voluptuosa ninfotransformação. Porque depois ela veio a completar seu chamado dentro do livro, a confirmação da tese naturalista. Mas até então havia ali uma promessa de desencaixe, de desajuste, e nisso residia seu fascínio para mim.

Qual foi o último livro que compraste?

O Príncipe, de Maquiavel, e A Arte da Guerra, de Sun Tzu. Os dois no mesmo dia. Estão aguardando releituras na estante. Leio primeiro os livros que me são emprestados. Os meus sempre aguardam a entressafra dos empréstimos para serem lidos.

Qual o último livro que leste?

As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino

Que livros estás a ler?

Além da Bíblia, de consulta quase tão freqüente quanto o Houaiss, Os Amores Difíceis, de Ítalo Calvino. Não gosto de intercalar leituras. Outros livros esperam com paciência sua abertura solene.

Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?

A própria Bíblia; Cem Anos de Solidão, de Garcia Márquez; 1984, de Orwell; Água Viva ou outro de Clarice Lispector; e Seis Propostas para o Próximo Milênio, de Ítalo Calvino, para o caso de algum dia sair da ilha.

A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e por quê?

A Ana Beatriz Guerra (À Segunda Vista) pelo texto ágil e plugado; A Ana Carolina (Mal Secreto), pelo humor descontraído dos seus posts; e a Crib Tanaka, do Desfio, que conheci na Casa das Mil Portas, junto com a Ana Carolina, e de quem admiro a sensibilidade de casar imagens e palavras belas.

Esquecimento

Vocês ouviram isso? Nada, ninguém ouviu nada? Talvez tenha sido um sonho. Melhor ver a porta da sala. Da cozinha. Não, tudo em ordem. A cachorra tambem está em ordem. Em ordem até demais. Nunca vi esse animal em silêncio. Bem, madrugada tem seus contrastes, seus estranhamentos. Melhor voltar a dormir e torcer para que Milu não tenha morrido. E é melhor que eu finalmente me lembre de comprar a ração.

segunda-feira, maio 16, 2005

A ver navios

Contemplo umas embarcações aqui no velho porto, não sei mais se no pensamento nem tão nítido voltado para a infância de barcos e passeios, não sei se realmente vendo-os, que realmente dia vai, dia vem, e a fronteira entre o visto e o pensado se torna cada vez mais milimétrica.

Chamou-me a atenção, tanto agora como antes, a placa na popa, voltada ao público de terra, onde se lê “afaste-se da hélice”.

E me pareceu oportuno observar que algumas coisas e pessoas e situações são como hélices: dinâmicas, borbulham, chamam atenção e fazem barulho, mas é precisão se afastar delas, antes que comecem a cortar. E foi só isso.

terça-feira, maio 03, 2005

Madrugada

Os ratos estão ansiosos por comer o veneno que acabo de servir.
O veneno, contudo, mantém-se calmo, esperando que o primeiro prove, que o segundo deguste, que a poção chegue ao líder, que todo o grupo morra.
Dormindo em minha cama de queijo, eu sonho com uma lua cheia.