domingo, agosto 02, 2009

Juízo final

E havia a lava morta, isenta de fogo, roubada de todos os calores. E ela estava em volta de mim, e me roubava o ímpeto da letra, meus irmãos. E meu estilo era tido como inerme e mortos eram os meus caracteres no silêncio indolente do dia que só tinha por virtude vir após outro dia.
Mas eis que, a despeito de toda a mortalha de cinzas que cobria meu ânimo, divisei a cálida, depois tórrida força motriz de um verbo obsessivo, que me impeliu ao alto como só um gêiser, que digo, como só o autêntico vulcão ativo, no inalcançável patamar de sua irreconhecível decisão ígnea, é capaz de produzir, com orgulho da má ou boa palavra. E aqui estou, neste altar das ressurreições, grato à caneta pela tinta que derrama, grato ao vinho que neste copo açoita os modorrentos embaraços, grato a todo vento de doutrina que vire as placas de todas as estradas para o derradeiro e preliminar caminho, e que este se encha de corpos que marcham, de vozes que cantam querelas ou cópulas, de almas salvas que queiram viver como quem sabe que jamais faltarão gritos de dor.